13.11.11

 

As Canções Italianas como Seguro Antídoto da Depressão

Por circunstâncias particulares, tenho vindo a recuperar a memória de muitas canções italianas, especialmente as das décadas 50 e 60 do século passado, época dourada não só da música, como do cinema italiano, que conquistava adeptos pelo mundo inteiro. De tudo isto, hoje, mesmo na Europa, só resta uma pálida imagem.


Surgem, no entanto, aqui e ali, alguns sinais de revivescência desta memória, como disso é prova um Programa que o veterano Júlio Isidro mantém na RDP, aos Sábados de manhã, entre as 8 e as 9 horas, designado – e bem – « A Ilha dos Tesouros», pois de ilha, no vasto mar circundante de lixo musical que o domina, e de tesouros se trata ali, em tão agradável quanto oportuno Programa de Rádio.


A eterna discussão da subjectividade ou objectividade dos gostos não nos deve obnubilar a inteligência, recusando hierarquizar temas ou matérias de cunho artístico ou cultural.


Nem tudo o que a Humanidade vai criando ao longo da sua História tem idêntico valor e, pretender negar a excelência, só redunda em triunfo do reles, do banal, do grosseiro, mal de que a nossa época padece em extremo, de tanto querer relativizar, de tanto pretender proteger os mais fracos ou desfavorecidos, confundido realidades sociais, efémeras ou contingentes, com a realidade artística, em que os critérios devem ser distintos, reconhecendo e destacando o melhor, o superior, da mera vulgaridade dominante.


Na Música, clássica ou ligeira, o fenómeno assume contornos análogos e só influências espúrias conseguiram impor o quase completo banimento das músicas italiana e francesa das Estações de Rádio, públicas ou privadas.


Inundando as programações das Rádios com vulgaridades, com lixo musical, acaba por se criar um público sem memória e sem critério, que consome apaticamente aquilo que lhe apontam como moda ou como sucesso.


Quando comecei a despertar para o mundo da canção popular ligeira, aí pelo meio da década de 60 do século passado, a música italiana já estava em franco desaparecimento, como, de resto, o mesmo acontecia com a francesa, de excelentes intérpretes, com canções suportadas em textos de forte conteúdo social, político ou filosófico, que ainda hoje nos surpreendem, pela profundidade, pelo sentido, pela contundência.


As canções italianas, pelo contrário, seduziam-nos mais pela sua riqueza melódica, cheias de ritmo, muito alegres, com letras simples, algumas de profundo lirismo, que facilmente retínhamos, mesmo com parco conhecimento da língua.


Entretanto, a onda anglo-saxónica fazia a sua entrada fulgurante, na Europa com os Beatles, e nos EUA, com inúmeros grupos de Rock e de música Folk, Country, Blues, etc., então de assinalável qualidade.


Infelizmente, este domínio da música anglo-saxónica, com o Rock-and-Rol, à cabeça, foi-se acentuando, ao ponto de viciar o público ouvinte, num só tipo de música, que assim ia perdendo sensibilidade para sequer apreciar música de outra natureza ou origem.


Concomitantemente, o Rock-and-Rol, associado ao consumo das drogas entre multidões de fãs permanentemente em delírio, foi-se degradando à medida que subia a potência dos equipamentos electrónicos, viciando e enlouquecendo as insaciáveis multidões de adeptos, de critérios já fortemente embotados.


Assim o império do lixo musical, maioritariamente anglo-saxónico, veio a expulsar toda a restante música, amputando a memória de gerações de ouvintes de Rádio, que, agora, só em cantos especiais, quais refúgios ou exílios de qualidade, podem ter a oportunidade de avaliar e comparar as preferências actuais com as de outras épocas, afinal, não muito distantes da presente.


Esta pequena reflexão ocorreu-me, hoje, ao dar, de manhã, no facebook, com uma extraordinária canção da italiana Mina, uma verdadeira maravilha para todos os sentidos, pela tocante simplicidade da sua interpretação dessa fogosa canção intitulada «Tintarella di Luna», que tanto fez dançar e vibrar passadas gerações de adolescentes e jovens adultos, sobretudo, mas que, pela sua intrínseca qualidade, continua ainda a entusiasmar-nos, muitos anos depois.


Talvez resida aqui a base do critério para avaliar este tipo de matérias: aquilo que resiste ao tempo, que continua a emocionar-nos, a despertar em nós sentimentos estéticos ou reflexões de ordem intelectual, semelhantes ou diversos dos que um dia nos dominaram, isso tem valor inequívoco, que ultrapassa claramente o gosto ou o condicionalismo da época em que foi criado. Assim o vejo, pelo menos, na falta de outro critério mais seguro.


E aqui deixo este cândido conselho : se querem um remédio fácil, ao alcance da mão, para combater qualquer veleidade de infiltração de pensamento deprimente, nada como ouvir estas canções italianas dos anos 50 e 60 do contraditório, mas, cultural e artisticamente, riquíssimo século XX.


AV_Lisboa, 13 de Novembro de 2011

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